Fico chocada ao ver quantas pessoas ainda parecem acreditar que um menino criado numa família chefiada por uma mulher irá automaticamente se comportar de maneira feminina. Quando muito, creio que a situação fez surgir em mim o lado mais moleque.

Aprendi a jogar futebol, basquete e uma variedade de outros esportes muito melhor do que quando era criança. Decorei o kidush da noite de sexta-feira há muitos anos. Também adquiri um pouco de habilidade básica em carpintaria, encanamento e outros reparos domésticos. Na primeira vez que troquei um pneu de bicicleta ou consertei um vazamento no banheiro tive uma sensação de conquista, e orgulho por saber que eu podia realmente cuidar das coisas.

Por mais que eu sinta que estou me esforçando para preencher dois papéis, (tento, pelo menos) eu sei, e meu filho de seis anos também sabe, que não é a mesma coisa que ter um homem na casa. Há um certo tipo de energia que está faltando, mas também há momentos em que me sento e choro, sem saber por quem ou por quê.

Creio que a reação da maioria das pessoas, depois do divórcio, tem sido de não julgar, e dar bastante apoio. Os amigos geralmente começam a telefonar por volta de Rosh Hashaná para combinar de levar meu filho para dançar com a Torá em Simchat Torá – algo que começou quando ele era tão pequeno e nós éramos tão novos na comunidade que a ideia de pedir a alguém que o levasse para o lado dos homens para a tradicional dança com a Torá nem passava pela minha cabeça.

E quando telefonei para alguém certa vez para cancelar os planos de jantar em sua casa na sexta-feira à noite porque eu estava com febre ela enviou uma deliciosa refeição de Shabat – por sensibilidade pelo fato de que eu não tinha um marido para descongelar alguma coisa. O mais difícil, na verdade, sobre ser divorciada numa comunidade ortodoxa tem sido convencer as pessoas que às vezes preferimos realmente comer em casa e está tudo bem.

A primeira vez que tentei foi no segundo Sêder de Pêssach depois do divórcio. De repente, senti esta vontade de criar nossas próprias tradições, e não participar daquelas de outras pessoas. Portanto recusamos um convite após o outro, finalmente dizendo às pessoas: "Oh, já planejamos passar o Sêder com uma família" (NOSSA família", eu pensava com um sorriso). Começamos com o ovo cozido – cantando canções do jardim da infância de meu filho, lendo a Hagadá com vozes engraçadas, dançando pela sala e gradualmente fizemos o Sêder como qualquer outra família – com risos, pontadas de fome, olhos irritados pelas semanas de limpeza, e incontáveis perguntas para acrescentar às quatro tradicionais.

Depois que meu filho adormeceu no meu colo, apressei-me com o restante e fomos cedo para a cama. Ele acordou pela manhã todo empolgado e correu para a mesa de jantar pedindo "mais Sêder, mais Sêder". Então começamos tudo de novo às 7 da manhã, sem determinadas preces, mas com muita alegria. Desde então, eu tenho tentado sair menos para o Shabat e ter convidados com mais frequência, e equilibrar isso com Shabat em casa, só nós dois. Quero que ele tenha uma infância tão normal quanto possível, e lembranças que sejam só dele, para recordar quando tiver sua própria casa algum dia – se D'us quiser, com uma parceira que será sempre dele.

Mas não é fácil. Meu filho tem notado que outros pais vão para casa à noite. E não há como ficar impassível ao ouvir seu filho lhe dizendo isso. Ele passou por uma fase em que queria saber por que seu pai e eu nos divorciamos. Em vez disso, expliquei por que nos casamos. Expliquei como ele precisava nascer, como fomos os pais que ele precisava, mas que não estávamos destinados a ficar casados, e isso não é algo que faça sentido completo ou que possa ser entendido – mas há vantagens nessa maneira de ser, bem como dificuldades, e toda vida tem isso – uma coleção de coisas tão únicas quanto sua alma.

Por mais jovem que ele seja, às vezes tenho a sensação de que entende o que eu digo melhor do que eu. E a verdade é que, na maioria das vezes, ambos sentimos ter uma vida muito boa. As reações dele, tanto verbais quanto emotivas, combinadas com sua personalidade e atitudes para com a vida, demonstram que ele consegue lidar 'com a situação' e não se sente diminuído com isso. Por sua vez, esta é uma enorme fonte de força para mim – como também a óbvia apreciação que ele tem pelas coisas que faço por ele.

Lembro-me de uma vez em que ele acordou às duas da manhã com uma horrível dor de estômago. Ele não costuma reclamar, portanto levei a sério. Para levá-lo ao posto de saúde precisei enrolá-lo num cobertor, colocá-lo no carrinho, e andar 15 minutos a pé subindo uma montanha às escuras (moramos em Israel, não temos carro e é impossível encontrar um táxi no meio da noite). Afinal, foi apenas uma virose e o médico "receitou" bastante repouso e líquidos para meu filho.

Enquanto eu empurrava o carrinho de volta montanha abaixo, escutando a respiração do meu filho adormecido, desejei que houvesse outro adulto na casa esperando acordado por nós, para perguntar-me como tinha sido, para dizer-me que eu não entrara em pânico, talvez para me oferecer uma xícara de chá. Meus vizinhos e amigos têm sido muito prestativos e me dado apoio, mas não se pode bater à porta dos vizinhos de madrugada e pedir uma xícara de chá – mesmo quando são tão bons quanto os meus. Especialmente quando são tão bons quanto os meus.

Quando eu estava carregando meu filho para dentro ele acordou e sorriu, então agradeceu de maneira tão sincera que toda a minha força voltou. Com chá ou sem chá – eu sabia que conseguiria muito bem vencer aquela virose. Infelizmente, não posso dizer que me sinto sempre forte ou segura da maneira de lidar com tudo isso. Às vezes nem sequer tenho certeza de conseguir pagar a conta do telefone. Mesmo assim, não me arrependo. Também não estou disposta a dizer que meu divórcio deveu-se simplesmente a uma falta de maturidade da minha parte (embora se possa afirmar isso sobre o fato de eu ter me casado).

Parte do trabalho de ser divorciada sobre o qual não se fala muito é o esforço para ser consciente da parte boa de seu ex-cônjuge. Quando há uma criança envolvida, isso se torna muito importante, porque todo filho é um híbrido de ambos os pais, e pode-se ver isso à medida que a criança cresce. As forças e fraquezas estão ambas ali, e você precisa enfatizar as forças da criança e tentar ajudá-la com as fraquezas, sem ir contra elas. Isso não acontece se você fechar emocionalmente seus olhos à humanidade da pessoa com quem já foi casada.

Você precisa desenvolver respeito por ele ou ela, e aprender a abençoá-lo pelo bem que ele investiu em seu filho, e ver como as diferenças entre vocês podem agora trabalhar juntas em harmonia, combinadas neste lindo ser humano, Vejo isso e fico sempre maravilhada – como meu filho encerra no caráter traços que são claramente meus e claramente do pai, e nele, em vez de criarem uma mini-guerra, cria luz – exatamente como na história do Báal Shem Tov transformando pingentes de gelo em velas.

Isso não equivale a dizer que às vezes não me sinto repugnada pelo comportamento do seu pai – mas tento olhar para o bem que há nele, e quando não posso ver, pelo menos o vejo em seu filho. Cheguei à conclusão de que não somente eu sou uma parte do meu filho e não somente seu pai é uma parte dele mas a maneira de nos relacionarmos é também uma parte dele e como ele olha para si mesmo – e não pode ser com raiva, ódio ou desdém.

O Judaísmo é bastante centrado em casamentos – o casamento entre nós e nosso Criador, o casamento de ideias, e – o mais santificado de todos – o casamento entre homem e mulher. A perfeição dessas uniões é a perfeição da própria Criação, o propósito para o qual Hashem fez o mundo existir. Portanto obviamente, a decisão de divorciar-me não foi uma que tomei levianamente. Porém há situações nas quais o divórcio não somente é permitido, mas segundo alguns – mandatório. E Aquele que nos deu as leis judaicas do divórcio (Guitin) é o Mesmo que nos deu as leis do casamento (kidushin).

Em última análise, decidi pelo divórcio porque acredito na santidade do casamento, e por mais que a ideia pareça ameaçadora para alguns, meu lar com meu filho não foi rompido e nós também não. Porém se eu tivesse continuado casada estaríamos. Eu estava. Todos os divórcios, como todos os casamentos, são ordenados no céu. Quando necessário, eles efetuam, como está descrito no comentário Ramatiim Tzafim sobre Tanna D'bei Eliyahu, uma redenção – comparável à nossa saída coletiva do Egito, e a uma retificação do corpo, mente e alma.

Seja no caso de eu me casar novamente ou continuarmos como uma família de dois, eu sei que nossas vidas – a minha e a do meu filho – estão ocorrendo agora – exatamente como deveriam ser, e que tudo que aconteceu – incluindo o divórcio – é exatamente o que nossas almas precisam.

E embora esta não seja uma situação ideal, e as coisas tenham estado longe de ser fáceis, sou muito grata pelo amor e amizade das pessoas que me cercam. Porém, o mais importante é que meus conflitos e dificuldades têm-me feito apreciar o bem e as bênçãos ocultas em todos os aspectos da minha vida. E eu tenho uma força, fé e relacionamento com meu Criador que eu nem sequer sabia ser possível. E quando eu sei que tenho Seu apoio, então sei que não sou uma mãe sozinha, afinal.