Há anos que não vejo meus pais nem falo com eles. Isso não se deve a negligência nem falta de atenção, é que eles não estão mais neste mundo.
Apesar disso, mantemos contato. Acho que você poderia chamar de um relacionamento a “longa distância”. Com isso em mente, gostaria de partilhar algo que me aconteceu nessa semana. Atualmente estou produzindo um nova série de desenhos animados para a Nickelodeon, e estava me preparando para visitar nosso estúdio de animação na Cidade do México.
Alguns dias antes da viagem, entrei na cozinha e vi algo estranho. Uma enorme sacola repleta de passaportes antigos. Eles pertenciam aos meus pais e avós. Surpreendentemente, junto com os passaportes havia um punhado de… pesos mexicanos.
Usamos passaportes para viajar de um país a outro. Ou, deste mundo ao próximo, como diz Carlebach em “The Munkacher Passport”, uma impressionante história. Não pude descartar a sensação de que meus pais, em seu eterno amor, estavam me dando dinheiro para eu gastar em minha viagem.
Mas como?
O Talmud ensina que este mundo e o próximo estão tão próximos como dois fios de cabelo na cabeça de uma pessoa. E tão conectados como um copo enfiado dentro de outro. Nossas dimensões estão interligadas. Apenas não temos olhos para ver isso. As notas eram velhas, mas no aeroporto, o homem por trás do guichê da casa de câmbio assegurou-me que ainda eram válidas.
Meu cunhado vive com a família na Cidade do México. Antes de eu viajar, minha mulher enviou a ele um e-mail perguntando sobre restaurantes casher perto do meu hotel. Ele respondeu secamente com o endereço de “um restaurante para minha alma”. Em outras palavras, a localização da sinagoga mais próxima para rezar, e o horário de início dos serviços matinais.
A verdade é que eu estava planejando ir ao minyan matutino, mas era bom ter um endereço e o horário.
Uma das coisas maravilhosas sobre fazer parte da comunidade judaica é que você pode entrar em qualquer sinagoga ao redor do mundo e instantaneamente falar a mesma língua. Paredes caem, e você percebe a Unicidade maior que todos habitamos.
Porém o verdadeiro motivo para eu estar escrevendo isto é contar o que aconteceu em seguida.
Durante as preces, alguém chegou coletando tsedacá, caridade para os pobres da comunidade.
Eu queria doar, mas estava num país estrangeiro, portanto não estava certo sobre o que fazer. Então percebi que tinha os pesos dos meus pais! Procurei no bolso, tirei as notas, e as doei para tsedacá.
Após a leitura da Torá eles me deram a honra de Galila, embrulhar o Rolo de Torá. Aprendi com Carlebach que essa aliyá é uma segulá, uma bênção para completar projetos; como foi apropriado!
A ideia de que os filhos podem atingir um local no tempo e no espaço ao qual nossos pais não têm mais acesso me surpreende. Que privilégio é sermos as mãos de nossos pais, e ter o potencial para completar aquilo que eles podem ter desejado fazer, porém não podem mais.
Isso, é claro, vai além dos nossos pais. Aplica-se aos sonhos de todas as gerações anteriores que trabalharam e ansiaram para trazer a redenção. Nós somos as mãos deles. Nós somos seus pés. Mas vamos mergulhar mais profundamente.
A mesma dinâmica que se aplica entre pai e filho também se aplica a nós e nosso próprio ser. Em Rosh Hashaná, Hashem cria um novo nós. A versão prévia de nós mesmos não existe mais.
Assim, o novo nós inspirado tem a capacidade de completar a obra, que o nosso velho ‘eu’ jamais teve uma chance de fazer. O novo eu, inspirado, pode chegar a um local (no tempo e espaço) e fazer aquilo que o velho eu pode ter desejado, mas jamais conseguiu realizar. Isso significa que posso consertar minha própria alma.
Que Hashem nos abençõe para vermos a maravilhosa compleição da nossa obra, da obra de nossos pais, e da obra às quais todas as gerações anteriores deram suas almas para tornar realidade.
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