Era um dia de liquidação, e o Walmart em Chicago estava lotado. Dezenas de pessoas vestidas com botas Uggs, calças jeans e agasalhos de lã olhavam atentamente para a impressionante variedade de brinquedos eletrônicos, utilidades domésticas, bolsas e ferramentas. Algumas pessoas estavam segurando xícaras de café Staubucks. Algumas se agarravam aos iPhones.
Eu também estava lá para comprar, mas fui com minha família e meu irmão deficiente, Josh. Estávamos procurando instrumentos.
O verdadeiro motivo para ousarmos entrar no Walmart num dia de liquidação foi porque estava frio demais para irmos a qualquer lugar lá fora, e não havia onde ir no bairro para caminharmos e fazermos barulho.
Josh mora num lar assistencial num subúrbio de Chicago. Além de postos de gasolina, lojinhas e locais de fast-food, ali não há muitos lugares para ir. Quando vamos visitá-lo, geralmente preparamos um cesto de piquenique e vamos comer no parque, mas hoje estava frio demais para ficar ao ar livre. Portanto além do Walmart e talvez da Target, onde mais poderiam ir dois pais, quatro crianças barulhentas e um adulto cego e mentalmente deficiente?
Então enfrentamos a multidão. E com três crianças penduradas ao lado do carrinho e uma no colo do meu marido, ziquezagueamos pelas prateleiras e quiosques até que chegamos ao corredor de artigos eletrônicos. Meu irmão e eu seguimos atrás, de braços dados, num passo lento e confortável para Josh.
Entrar na seção de artesanato era como entrar num ataque de pânico. A seleção de objetos era indescritível. Prateleiras lotadas com sedutoras garrafas de cola, frascos brilhantes, crayons lindamente embalados, e uma montanha de tintas, todas gritando: “Compre-me, compre-me, você precisa de mim, vou fazer você feliz!” E, em vez de apenas pegar o que precisávamos e entrar na fila para pagar, fomos envolvidos, e nos vimos pensando: devemos comprar a caixa com 10 pincéis atômicos, ou a maleta tamanho gigante com 500 pincéis seria melhor? Deveríamos comprar 500 palitos de picolê por $5, ou 1.000 palitos por $10? As crianças queriam cartolina. Cola. Bolas felpudas e lápis coloridos. Pincéis não estavam na nossa lista, mas eram tentadores. Pensando bem, era o brilho no escuro. Livros para colorir estavam em oferta, compre um, ganhe outro grátis! Massinha de modelar vinha com um brinde. Tudo parecia divertido - e educativo. E agora, já que você mencionou, precisamos de mais giz.
E foi então que Josh começou a uivar como um lobo engaiolado. “Wooooo! Wooooo! Wooooo!” Ele deu três uivos altos, e sacudiu as mãos em volta dos ouvidos como um motorista bêbado. As pessoas pararam de comprar para assistir, e eu sabia que tinha de parar também. Então saí da minha crise de indecisão e segurei o braço dele. Guiei-o corredor afora em outro passeio. Enquanto isso, meu marido e meus filhos foram deixados agonizando ao lado de canetas coloridas e pincéis.
Assim que Josh e eu começanos a andar, ele se acalmou. Demos alguns passo, mudamos de direção e saímos na seção de brinquedos. De repente Josh estacou. “Vamos, Josh,” eu disse. “Vamos continuar andando.” Mas ele se recusou. E eu não consegui forçá-lo. Portanto não tinha escolha a não ser ficar com ele. Parada. De braços dados. Na seção de brinquedos do Wal mart durante a época mais movimentada do ano.
E foi então que parei de prestar atenção nas ofertas e comecei a notar as pessoas. Adultos educados, olhando brinquedos como zumbis num desfile de zumbis. Adultos normais, funcionantes, consumidos pelo consumismo, e completamente fascinados por coisas, como se as coisas fossem o mais importante do mundo.
Meu momento de observação foi somente aquele, porque quase imediatamente Josh saiu do seu silêncio e começou a murmurar. Então a assobiar. Assobio alto. E com um trejeito fluido, quase como um tango, começou a dançar ritmicamente de um lado a outro. E fiz o mesmo. Deve ter sido uma cena e tanto, ver a senhora de saia longa e lenço na cabeça ondulando de braços dados com um cego que assobiava. As pessoas viravam o pescoço para o lado e nos olhavam com o rosto torcido. Pelo que sei, provavelmente estavam pensando que o show de aberração tinha chegado. Eu estaria mentindo se não dissesse que estava um pouco constrangida. Mas essa era minha realidade. Meu irmão era assim, e isso era algo no qual eu estava melhorando. Respirei fundo, e aceitei. E até gostei.
À medida que atraíamos uma pequena plateia de pessoas que provavelmente estavam gratas por não estarem em nosso lugar, ali de pé com Josh - e se sentindo tão elevada por ele - não pude deixar de me sentir grata por não estar no lugar deles. Hipnotizada no Walmart, perdida num ciclone de artigos, confusa e cercada por “coisas” por todos os lados, eles me pareciam dignos de pena naquele momento. Josh era o único ali que parecia serenamente alegre, felizmente ligado ao eterno, e inexplicavelmente sábio. E por um instante, fui feliz por estar naquele espaço com ele.
Sentindo-me um pouco como uma espaçonave pairando acima da cena, eu me vi entalada entre o comprador obsessivo e o homem cego ascético, clarividente. Cercada por compradores durante a corrida da liquidação no Walmart, senti-me como uma metáfora, um instrumento de ensino, um teatro vivo, uma mensagem de saudação de D'us. Sim, eu também sou uma consumidora, obcecada pelas coisas, com frequência levada a pensar que preciso de tudo, perguntando como pude viver sem aquilo. Porém sou conectada e influenciada pelo meu grande irmão, que não tem nada nem deseja nada além das roupas que veste, a comida em seu prato, e o amor e apoio das pessoas que o cercam. Ele consegue o que precisa, e sabe que lhe será dado na hora certa.
Quando almejo pelo meu melhor, luto para ser mais como ele. Josh não precisa se perguntar se um aparelho na cozinha vai melhorar sua qualidade de vida. Ele não tem jaqueta North Face, não tem Uggs, nem calça jeans da moda. Não tem iPod, iPad nem celular touch screen. Não tem mala de artista, Starbucks nem outras coisas da moda. Nenhuma distração! Ele tem sua respiração, Tem o momento. Ele tem D'us.
Ali de pé com Josh em meio à loucura, senti a magia fugidia que aparece além do alcance naqueles comerciais de café instantâneo. A calma. A paz. O conforto. Ali de pé com Josh, eu tinha o que todos realmente precisamos, e isso é um ao outro. Amor. Boas ações. Conexões do coração. Balançar juntos de braços dados. O momento. Como escreveu o Rei Shelomo no Eclesíastes: “Vaidade das vaidades, tudo são vaidades.” E todas as “coisas” - por mais que eu as ame, por mais que todos as “amem”, no fim irão desaparecer. Não irão significar nada para nós.
Estar naquele momento com Josh, naquela sabedoria, foi o supremo especial do Walmar.
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