Nota do Editor:
Numa carta a um participante numa conferência sobre “Problemas e Necessidades de Retardados Judeus”, o Rebe expressou sua opinião de que era uma caracterização imprópria, e que preferia o termo “especial”.

Pela Graça de D'us
22 de Av, 5739 (15 de agosto, 1979)
Brookly, NY

Sr. R. Wilkes, Diretor do Programa de Assistência, II Região,
Conselho para Retardamento Mental
Hospital Coney Island

Saudações e Bênção:

Esta é em resposta à sua carta de 9 de agosto, na qual você pede minhas opiniões sobre “os cuidados e educação das crianças judias retardadas”, abordando alguns dos problemas relacionados a isso e as políticas mais usadas etc.

Devo, antes de mais nada, fazer uma observação essencial, ou seja, que embora o título acima coloque todos os retardados em um grupo, seria uma enorme falácia apresentar quaisquer regras para serem aplicadas a todos eles como um grupo. Pois se qualquer criança precisa de uma avaliação individual para dar o máximo em seu desenvolvimento, muito mais então no caso dos deficientes.

Como o acima é tão óbvio, presumo que você tenha em mente as linhas mais gerais, com uma vasta gama de flexibilidade, permitindo a necessária abordagem individual em cada caso. Além disso, sinto dizer, nossa sociedade atual é mal equipada em termos de formação humana e recursos financeiros para permitir um tratamento pessoal adequado a cada menino ou menina deficiente. Ainda mais lamentável é o fato de que pouca atenção (pouca, em face da importância do problema) seja dada a essa situação, e consequentemente pouco seja feito para mobilizar mais recursos adequados para lidar com o problema.

Ora, no que diz respeito a orientações em geral, eu sugeriria o seguinte:
(1) O trabalhador social, ou professor, e quem lida com indivíduos especiais deveria começar da premissa básica de que o retardamento é em cada caso somente um problema temporário, e que no devido tempo certamente vai melhorar, e até melhorar substancialmente. Essa abordagem deveria ser adotada independentemente de pronunciamentos ou prognósticos de especialistas nessa área. O motivo para essa abordagem é, em primeiro lugar, porque é uma pré-condição para maior sucesso em lidar com crianças especiais. Além disso, considerando os enormes avanços que têm sido feitos na ciência médica, conhecimento humano, metodologia e estudos, não restam dúvidas de que nessa área, também, haverá muito desenvolvimento. Assim, a própria confiança de que tal progresso está no âmbito da possibilidade vai inspirar maior entusiasmo nesse trabalho, e certamente vai também inspirar uma pesquisa mais intensiva.

(2) Assim como a mencionada abordagem é importante sob o ponto de vista do educador e de quem trabalha na área, também é importante que os estagiários sejam encorajados com palavras e por treinamento, para sentirem que não há, D'us não o permita, “casos” muito menos desafortunados ou sem esperança, mas que sua dificuldade é considerada somente temporária, e que com um esforço concentrado do instrutor ou estagiário a desejada melhora será intensificada e apressada.

(3) Desnecessário dizer, deve-se tomar cuidado para não exagerar nas expectativas por meio de promessas impossíveis, pois falsas esperanças inevitavelmente resultarão em profundo desencanto, perda de credibilidade e outros efeitos indesejáveis. Porém, certamente pode-se encontrar uma maneira de evitar trazer falsas esperanças, sem deixar de dar encorajamento.

(4) Como parte da abordagem acima, que pelo que sei não foi usada antes, é envolver, (alguns) estagiários numa forma de liderança, como capitães de equipes, líderes de grupos e outros semelhantes, sem despertar a inveja de outros. Isso poderia ser evitado fazendo essas seleções com base na idade, conduta exemplar e realizaçao especial.

(5) Quanto aos esforços que têm sido feitos nos últimos anos para criar “lares de grupo” para indivíduos especiais, que, como você diz, têm sido uma fonte de controvérsia, deve-se esperar que como na maioria das coisas em nosso mundo imperfeito, haja prós e contras. No entanto, creio que a abordagem deveria ser a mesma como no caso de todos os pupilos ou estudantes que passam parte do tempo em grupo: escola, dormitórios, acampamentos de verão, etc., e parte do tempo com a família, seja todo dia ou fins de semana, etc. Somente por meio de abordagem e avaliação individual pode ser determinado qual indivíduo se enquadra em qual categoria.

(6) Certamente não há necessidade de enfatizar que, como em todos os casos envolvendo judeus, suas necessidades judaicas específicas devem ser levadas em conta. Isto é especialmente verdadeiro no caso de crianças judias retardadas, porém muitas vezes isso é desconsiderado. Infelizmente há um equívoco prevalecente de que como você está lidando com crianças com capacidades limitadas, elas não deveriam ter “o fardo” da educação judaica além da sua educação geral, para não sobrecarregá-las. Em minha opinião essa é uma atitude errada e prejudicial, especialmente pelo que foi dito acima sobre evitar impor o problema sobre a criança. Deve-se lembrar que uma criança vinda de um lar judaico provavelmente tem irmãos e irmãs, ou primos e amigos, que recebem educação judaica e estão expostas a observâncias judaicas. Até na sociedade americana, na qual judeus observantes não são a maioria, sempre há uma medida de experiência judaica, ou ângulo judaico, na criação da criança. Portanto, se a criança especial vê ou sente que tem sido deixada de lado e removida daquela experiência, ou quando por fim descobre que é judia, porém foi privada da sua identidade judaica e de seu legado, é provável que isso cause danos irreparáveis.

Os próprios estagiários devem ser encorajados com palavras e pelo treinamento a sentirem confiança de que não são, D'us não o permita, “casos”.

Por outro lado, se a criança estiver envolvida em educação e atividades judaicas, e não de maneira geral e periférica, mas de forma real e tangível, como no cumprimento das mitsvot, costumes e tradições, isso lhe dará um senso de pertencer e estar apegado, e uma firme âncora para se segurar, consciente ou inconscientemente. Com o tempo uma sensação subconsciente de segurança interior passaria para o estado consciente, especialmente se o professor se esforçar para cultivar e fortalecer esse sentimento.

Estou, obviamente, consciente dos argumentos que devem ser propostos sobre esta ideia, ou seja, de que exige fundos adicionais, pessoal qualificado etc., não prontamente disponíveis no momento. Com certeza, esses são argumentos que têm como base as coisas como são agora. No entanto, o verdadeiro problema não é tanto a falta de recursos com o principal que considera o ângulo judaico como de importância secundária, ou menor; consequentemente o esforço para remediar a situação é comensurada, resultando numa profecia auto-realizadora. A verdade da questão é que se a importância disso for vista sob sua verdadeira luz, que é um fator essencial no desenvolvimento das crianças judias retardadas, além da nossa obrigação elementar com todas as crianças judias sem exceção, os resultados serão bem diferentes.

Talvez tudo que foi dito acima não seja o que você tinha em mente ao solicitar minhas opiniões sobre “lares de grupos”. Apesar disso, vi-me obrigado a demorar-me sobre o assunto, não apenas porque isso tinha de ser dito, mas também porque pode servir como base para resolver a controvérsia sobre a criação de “lares de grupos” para aquelas crianças que atualmente estão colocadas num ambiente distante de seu lar individual e da comunidade, parafraseando sua declaração.

Finalmente uma observação conclusiva sobre sua referência laudatória ao Movimento Lubavitch, “com sua profunda preocupação com o bem-estar de todo indivíduo judeu” etc. Desnecessário dizer, tal avaliação é muito gratificante, mas devo confessar e enfatizar que esta não é uma ideia original de Lubavitch, pois é básica ao Judaísmo da Torá. Assim, nossos Sábios declararam que ve’ohavto lere’acho ko’mocho (“Ama teu próximo como a ti mesmo) é o Grande Princípio de nossa Torá, com ênfase no “como a ti mesmo”, pois toda pessoa certamente tem uma atitude muito especial e pessoal consigo mesma. Para crédito dos emissários de Lubavitch deve-se dizer, porém, que eles estão fazendo tudo que podem para implementar e viver segundo esta Regra de Ouro da Torá, e fazendo isso incansavelmente e com entusiasmo.

Que o Zechut Harabim, o mérito dos muitos que se beneficiam com seus sinceros esforços para ajudá-los em sua necessidade, especialmente em seu cargo como Diretor Regional do Conselho para Retardamento Mental, traga-lhe sucesso pleno e estimule sua dedicação para realizações ainda maiores.

Com estima e bênção,
[Assinatura do Rebe]