Pessy Matusof, há longo tempo um emissária Chabad-Lubavitch, diretora da escola de Ensino Médio para meninas em Casablanca, influenciou o desenvolvimento educacional e espiritual de milhares de marroquinos, faleceu aos 86 anos.
Junto com seu marido, Rabino Shlomo Matusof, a educadora nascida na Rússia estabeleceu uma abrangente rede de escolas para a comunidade judaica num mundo árabe, ajustando-se à súbita mudança internacional e cultural trazida pela independência de Israel.
Nascida Pessiah Krassik em 1924, filha de Rabino Leibel e Eidele Krassik, a infância de Pessiah foi passada em Nevel – onde seu pai atuava como mentor espiritual a pedido do quinto Rebe de Lubavitch, Rabi Shalom Dovber Schneersohn, e mais tarde, em S. Petersburgo.
Na metrópole do norte – então conhecida como Leningrado – os Krassik moravam perto da principal estação de trem, um local que lhes permitia abrigar ativistas judeus que viajavam secretamente de cidade em cidade para fortalecer as comunidades locais, recebendo a condenação das autoridades soviéticas. “Ela sempre nos contava sobre as reuniões chassídicas em casa”, relembra seu filho, Rabino Eli Matusof, erudito e editor da Kehot Publication Society, o ramo editorial de Chabad-Lubavitch. Eles eram mantidos em segredo em sua casa. Ela gostava das melodias chassídicas que os gigantes [espirituais] cantavam com anseios em servir a D'us.”
As lembranças da opressão soviética permaneceram com Matusof muito depois de ela ter saído da Rússia e estabelecido seu lar na monarquia constitucional do Marrocos. Toda sexta-feira à noite, enquanto acendia velas para recepcionar o Shabat, ela se lembrava da trepidação que tivera pois, a qualquer momento, a KGB poderia apanhar sua família observando o Judaísmo.
“Mesmo com todo o medo,” disse ela, “nunca deixamos de acender as velas.”
Durante a Segunda Guerra Mundial, o pai de Matusof serviu no Exército Vermelho, numa fábrica de munição. Matusof, sua mãe e irmãos se encontraram, como a maioria das pessoas na cidade, sem o pai e marido durante o grande cerco de Leningrado.
“Os meses de verão não foram de todo ruins,” lembrou ela, “pois [as pessoas] conseguiam trazer comida através do lago Ladoga.Mas quando chegou o inverno e o lago congelou, tornou-se diciil trazer comida para a cidade e as pessoas morriam de fome nas ruas.”
O lago tornou-se a rota de fuga de Matusof, e ela conseguiu sair da cidade para reunir-se ao pai nos Montes Urais. Sua irmã Chiyena juntou-se a eles logo após, mas vários meses depois, o pai faleceu de um ataque súbito. Depois do enterro, as irmãs souberam que a mãe tinha morrido de inanição em casa.
As irmãs órfãs decidiram ir para a casa de seu tio Yona Poltova, em Tashkent, Usbequistão, onde ele dirigia uma grande parte da rede nacional de escolas Lubavitch secretas. Partiram com lembranças de família e papéis, mas a tragédia se abateu sobre elas mais uma vez, quando assaltantes as deixaram sem qualquer objeto ou documentos de identificação.
Desesperadas, elas procuraram uma repartição do governo para pedir vistos de trânsito, mas lhes foram negados. Sem família, sem dinheiro, elas foram para a rua quando Matusof ouviu alguém que a chamava, usando seu nome russo, Pola.
A mulher era alguém que Matusof tinha ajudado a obter rações diárias em Leningrado. O marido da mulher era um funcionário do governo, que arranjou para que as meninas conseguissem os vistos de viagem necessários para chegarem ao Usbequistão.
Depois da guerra, as garotas novamente fugiram, dessa vez para fora da União Soviética, e foram para a França, onde Matusof se tornou professora e ganhou renome como excelente educadora.
Quando menina, Pessy Matusof fugiu do Cerco de Leningrado e, após o final da Segunda Guerra, da União Soviética.
Do Inferno Russo para o Desconhecido Marrocos
Em 1950 em Paris, Matuosf casou-se e pouco depois o Rebe, Rabi Menachem Mendel Schneerson, de abençoada memória, orientou o jovem casal a mudar- se para Casablanca e ajudar a nascente rede de instituições Lubavitch no Marrocos.
Quando chegaram ao país francófono, os Matusof encontraram uma população inquieta exigindo a independência. A violência era generalizada.
“Minha mãe se lembrava da violenta rebelião nas ruas,” disse a filha Baila Palatinsky. “Ela literalmente saiu do fogo para a frigideira, deixando a guerra na Rússia e chegando a uma guerra no Marrocos.”
Sem se abalar com a política do momento, os Matusof e outros emissários Chabad-Lubavitch matricularam crianças judias em suas escolas. A missão da rede educacional era simples: elevar o nível de estudos judaicos e promover a observância religiosa face à assimilação que corria solta sob a influência francesa na sociedade.
Apesar das dificuldades, “ela nunca questionou nem reclamou,” disse Palatinsky.
Segundo a filha, a vida no Marrocos naqueles primeiros anos não foi fácil. A família comia peixe enlatado durante a semana, e se tivesse sorte, conseguia peixe fresco para a mesa do Shabat. O jovem casal recusava-se a pedir mais apoio financeiro ao exterior, mas quando o Rebe soube da situação na casa dos Matusof, ele imediatamente instruiu o Bureau Europeu de Chabad-Lubavitch a aumentar o repasse de fundos à família.
Mantendo as Tradições Locais
No Marrocos, os recém-chegados foram recebidos pela população judaica local de abraços abertos, disse Danielle Gabay, uma das alunas de Matusof. “Em tudo que faziam, eles tinham grande respeito pelos costumes locais,” recorda Gabay.
Ilustrando esse ponto, Batya Ashkenazi disse que embora os Matusof e outros funcionários da escola aderissem aos costumes dos judeus do Leste Europeu, insistiam para que “as leis judaicas e os costumes fossem ensinados por um rabino sefaradita local.”
Os Matusof “elevaram a base das meninas a um nível muito mais alto,” disse Gabay, “e deram a elas as ferramentas para lidar com a onda de assimilação.”
“Quando cheguei aos Estados Unidos, estava com um bom nível acadêmico e continuei minha educação em Medicina,” disse Ashkenazi. “Nos estudos judaicos, minhas amigas se tornaram reitoras de escolas em todo o mundo.
Eu não senti que a nossa educação deixava a desejar em relação ao sistema americano.”
Segundo Gabay, Matusof tratava as moças – que vinham de longe para morar no dormitório em Casablanca – não como estudantes, mas como membros da família.
“Se ela soubesse que alguém estava doente, ia conferir depois da escola,” disse Gabay. “Ela sempre tinha o toque certo e as palavras certas para transmitir a elas.”
A casa dos Matusof estava sempre repleta de visitantes da escola e da comunidade local, muitos dos quais procuravam a educadora em busca de conselhos.
“Enquanto ela descascava batatas,” lembra-se Palatinsky, “sempre havia alguém ali falando sobre problemas que estava tendo com as crianças. Matusof entendia as pessoas e ouvia tudo que tinham a dizer,” disse Gabay. “Você sempre sabia que ela nunca, jamais, repetiria o que você falou a outras pessoas.”
Quando Pessy Matusof chegou ao Marrocos, falava francês fluente, mas chegou a um mundo estrangeiro, tumultuado.
Auto-Sacrifício
Saber que os Matusof tinham deixado uma comunidade de amigos Lubavitch para mudar a uma terra estranha no norte da África granjeou o respeito dos habitantes locais em seu novo lar. A partida dos filhos dos Matusof para as escolas Lubavitch na Europa destacou ainda mais o auto-sacrifício da família.
“Separar-se dos filhos foi muito doloroso para minha mãe,” disse Palatinsky.
“Lembro-me das cartas semais que chegavam das crianças na França e do grande entusiasmo quando as cartas eram abertas.”
Numa audiência privada com o Rebe, Matusof certa vez reclamou sobre como era difícil ficar longe dos filhos e sugeriu que talvez estivesse na hora de a família mudar-se de volta para a França.
O Rebe respondeu com um sorriso e voltou a atenção da mãe para como os filhos dela; estavam se saindo bem. “Há excelentes relatos sobre o progresso de seus filhos nos estudos e em suas participações na divulgação do Judaísmo após as horas de estudo,” disse ele antes de dar muitas bênçãos para Matusof e sua família.
“Era surpreendente eles estarem tão longe da família,” disse Ashkenazi, “As pessoas apreciavam muito isso.”
Legado Mundial
Entre as inovações que Matusof levou para a vida judaica em Casablanca estavam as palestras que promovia para mulheres no Shabat. Ela arranjava os oradores, enquanto os moradores se responsabilizavam pelo lanche. Em pouco tempo, as reuniões ficaram tão grandes que elas tiveram de transferi-las para a escola, onde cerca de 200 mulheres participavam.
“Isso deu à comunidade uma chance de aprender, embora não tivessem ido à escola durante anos,” lembra-se Ashkenazi.
Matusof, cujo francês era excelente, preparava folhetos para a comunidade local sobre várias tradições judaicas. Ela também ensinava as mulheres sobre as leis da pureza familiar.
“Ela tinha tantas alunas e moldou tantas pessoas,” disse Gabay. “Pessoas do mundo inteiro a viam como uma mãe espiritual. Essa é uma grande perda para a comunidade judaica marroquina no mundo inteiro.”
O luto estendeu-se ao governo marroquino.
“Não há palavras para expressar nossos sentimentos pela perda de uma senhora desse porte,” escreveu Mohamed Karmoune, Cônsul Geral do Marrocos em Nova York, para a família. “Ela dedicou tanto tempo e esforço para ajudar as escolas Chabad-Lubavitch, Talmud Torá e Otzar Torá no Marrocos.”
Os filhos e netos de Matusof atuam como emissários Chabad-Lubavitch pelo mundo inteiro. Os últimos de seus descendentes, Rabino Arele e Chaya Matusof, mudaram-se recentemente para o Canadá para estabelecer o “Friendship Circle”, Círculo de Amizade, de Calgary, e promover atividades judaicas para os jovens na cidade.
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