Em relação ao emocionante relato de valentia e heroísmo desempenhados por Rabi Yossef Yitschac Schneersohn, apresentamos a seguir uma adaptação livre do pronunciamento do atual Lubavitcher Rebe, Rabi Menachem M. Schneerson, de 13 de Tamuz de 5722
(Licutei Sichot, vol.IV pág.1061)
Entre as histórias narradas pelo ‘Rebe Anterior’ sobre sua prisão e libertação, algumas se referem a seu período de confinamento. Entre elas, uma relata o seguinte episódio:
Nem bem o Rebe foi introduzido na prisão, tomou a firme resolução de manter a calma e não dar mostras de medo nem temor perante os membros da G.P.U. Resolveu não considerá-los, não somente no que concernia à religião, mas ignorá-los-ia completamente. Observava-os, utilizando a linguagem do Rebe, como se fossem “nulos, absolutamente nada”. Esta atitude manteve-se imperturbável mesmo quando foi severamente castigado por negar-se a responder às perguntas.
Seu castigo constituiu-se em ser confinado em um calabouço cheio de lama. Nem sequer havia no que se apoiar. Além disso, pelas paredes perambulavam todos os tipos de insetos e roedores.
Nessa cela tenebrosa, o Rebe ficou aprisionado durante quase 24 horas. Mesmo assim, apesar desse tormento, sua firme decisão manteve-se de pé. Para ele, seus carcereiros continuaram sendo “nulos e absolutamente nada”.
Na quinta-feira, Rosh Chôdesh Tamuz, às 11 horas (em sua narrativa o Rebe observou que na prisão costumava estender-se mais em suas orações), guardas ingressaram em sua cela e ordenaram-lhe que se levantasse. Falavam em russo, mas o Rebe costumava responder sempre em yidish.
“Não me porei de pé” - foi a resposta categórica.
O sistema da prisão exigia que quando fosse necessário transmitir alguma informação ao prisioneiro, este deveria levantar-se para, assim, mostrar sua submissão. Levando em conta a intransigente posição do Rebe, torna-se fácil compreender o porquê de sua negativa.
Aparentemente um dos guardas era um judeu que sabia yidish. Ao escutarem a resposta do Rebe, replicaram: “Se não acatar à ordem, nós o golpearemos!”
“Nu (E daí)” - foi a resposta atrevida. Eles cumpriram sua ameaça e retiraram-se.
Posteriormente, ingressou em sua cela um segundo grupo de guardas, entre os quais encontrava-se também Lulov (que havia participado de sua detenção, seu traslado à prisão de Spalerna e seu posterior interrogatório). Lulov era descendente de uma família de chassidim e quando dirigiu-se ao Rebe, começou suas palavras com a expressão “Rebe”.
“Rebe! Por que precisa irritá-los? A que se deve esse tipo de conduta para com eles? Mais ainda, eles vêm para notificá-lo de uma diminuição em sua pena. De modo que, se ordenaram-lhe que se levante, levante-se!”
O Rebe permaneceu impassível, e não respondeu. Lulov disse novamente: Mas vão surrá-lo!” Ainda assim o Rebe mantinha-se calado. Esbofetearam-no pela segunda vez. Um dos guardas o atingiu com um soco no queixo. (A dor desse golpe lhe causou sofrimentos durante muito tempo depois.) Concluída a “missão”, eles se retiraram.
Quando se apresentou um terceiro grupo (entre eles um judeu chamado Cavalov) e ordenaram-lhe que levantasse, o Rebe respondeu que não se ergueria.
Voltaram a castigá-lo severamente - o executor da tortura foi Cavalov - mas em vão. Cavalov ficou furioso e gritou: “Vamos dar-lhe uma lição!”
“Vamos ver quem ensinará a quem…” - respondeu o Rebe, em yidish. Pouco tempo depois, uns policiais entraram e lhe pediram que se apresentasse ao escritório da prisão. Ali informaram-no da impugnação da pena à qual Lulov havia se referido. Estava livre da prisão, mas haviam-no sentenciado a três anos de exílio na cidade de Costroma.
Quando o Rebe aproximou-se da mesa viu sobre ela os papéis referentes a seu caso. Percebeu que uma linha estava riscada. (Lá estava escrito que ele havia sido condenado à morte. Uma vez que o Rebe contou este fato enquanto estava vivo, não quis pronunciar estas palavras e disse somente que “a linha estava escrita e riscada”.)
Abaixo desta havia outra com o veredicto de que deveria ser enviado por dez anos de trabalhos forçados a Solovski. Ao lado desta frase estava escrita a palavra “Niet!” (“Não”). Finalmente estava a ordem: “Três anos em Costroma.”
Quando lhe comunicaram que seria enviado por três anos ao exílio, perguntaram ao Rebe em que trem desejava realizar a viagem. “No ‘medjdunarodne’ (nome dos vagões destinados à classe governamental ou rica).”
“Tem com que pagar este luxuoso transporte? É um modo muito caro de viajar!”
“Se o dinheiro que está neste escritório e que me pertence, o qual me foi tirado ao ser preso, não for suficiente, darei uma ordem a meus familiares para que paguem minha passagem.”
Os oficiais concordaram. “Às duas da tarde você será libertado da prisão. Terá seis horas para estar em companhia de seus familiares. À noite deverá abandonar a cidade e iniciar a viagem para Costroma.”
Tendo em vista que era quinta-feira, o Rebe perguntou de imediato: “Para quando está prevista a chegada em Costroma?”
“Para o sábado.” “Sábado? Shabat? Não, de forma alguma. Eu não viajo no Shabat.”
Quando o Rebe relatou este episódio, finalizou: “Graças a D-us, não viajei no Shabat!
Permaneci na prisão até domingo - pois não me foi permitido permanecer mais tempo em casa.”
No domingo, durante o dia, esteve em sua casa e à noite iniciou a viagem rumo a Costroma.
O Rebe acrescentou à sua narrativa que o chassid, Reb Michael Dworkin chegou a Costroma antes e, nesse meio tempo, reuniu um grupo de crianças judias com as quais fundou um “chêder” (uma escola de Torá) e também preocupou-se para que o micvê local fosse reparado e condicionado a ser usado.
Isto significa que aquelas mesmas atividades que ocasionaram a prisão e a sentença de morte do Rebe - e que graças a gestões e de um modo milagroso foi comutada para três anos de exílio – foram reiniciadas nem bem o Rebe abandonara as paredes da prisão; ainda antes que chegasse a Costroma, enviou para lá um emissário seu para que fundasse um chêder e reparasse ao micvê para o uso público.
As histórias dos acontecimentos ocorridos com um líder do povo de Israel, ainda mais quando narradas por ele mesmo, constituem um ensinamento em nosso modo de servir a D-us:
Uma vez mostrado o exemplo e aberto o caminho pelo líder da geração, é dada a possibilidade de que quando qualquer judeu decidir com uma vontade inabalável que todo intuito de “ocultar” a alma Divina e todas as barreiras e obstáculos que obstruem a propagação do judaísmo e da Torá sejam nulos e nada absolutos, consegue-se então que mesmo aquele judeu que momentaneamente se encontra “do outro lado” tome consciência de que o judaísmo da Torá existe, a Chassidut existe, e existe um tsadic - até que ele sofra uma mudança radical em sua vida e diga com total naturalidade: “Rebe”.
Seguindo esta conduta, o judeu levará adiante todos seus afazeres com êxito - e se necessário for, por meio de milagres - não somente nos aspectos fundamentais, mas também naqueles que, se comparados aos essenciais, revestem-se de um mero caráter de “secundários”. Como costumava dizer Rabi Shalom DovBer, o quinto Rebe de Lubavitch:
“Permanece íntegra não somente a essência, mas também a expansão.” Somente assim se adquire a liberdade espiritual - com braço erguido, i.e., altivamente.
Quanto maior pode ser – e realmente deve ser – o esforço para o êxito, se o judeu vive em uma época e lugar que lhe proporcionam a oportunidade de difundir o estudo de Torá e o cumprimento das mitsvot sem obstáculos nem impedimentos. Recebe-se ajuda para isso, e a recompensa vem também neste mundo não somente no Mundo Vindouro.
Com a firme e enérgica resolução de que a missão que nos foi designada pelo Criador deve ser cumprida, que nenhum impedimento deve ser levado em conta e que não devemos desanimar diante das dificuldades que possam surgir, o judeu pode ter a plena certeza de que “a vontade de D-us terá êxito em suas mãos” na atividade de difundir a Torá - revelada (Niglê) e oculta (Chassidut) e o cumprimento das mitsvot, até conseguir a concretização da profecia: “A Terra ficará repleta do conhecimento de D-us, tal como as águas encobrem o leito do oceano”, com a iminente chegada de Mashiach, em nossos dias.
Faça um Comentário